Não consigo obrar; 706230 e uma paulada na cabeça... minha obra não sai; é muita energia condensada num fino raio laser de Leite Glória preso na garganta. Eu faço força mas não consigo mais obrar Glória Ave Maria! Aves que revoam na cidade que ficou vazia num domingo à tarde quando ainda é cedo, e nada mais cabe nada permanece no meu pendrive contaminado por tantos Cavalos de Tróia tanta sorte tanta gente noia nessa vida trojan como um Ray Rogers em seu alazão, girando dois revólveres... apontando-os para mim, dizendo “me empreste o seu cérebro”. Dois dias faltando água nos meus condomínios e eu imaginando dormir sobre o Aquífero Guarani mijo e já nem me lembro do que sonho; nem ligo se a cama estremece; apenas estendo os braços acendo outro cigarro e faço minha prece. Desligo o interruptor e fico olhando para o ventilador no teto, lembrando de uma outra vida em forma de fotografia; uma vida pequena 3x4 domesticada, que, com muito orgulho, trago agora aprisionada no lado interno dos meus olhos, como um tesouro; vendo o tempo passar lá fora; fugindo das madrugadas frias; puxando meu próprio cobertor; risadas lá fora (?) ... Quem será a essa hora da madrugada? Cantando e chutando garrafas vazias, andando pelas ruas, descendo a Barreto Leme talvez (?) Quem será?
Não consigo mais dormir três horas consecutivas tranquilamente, pois tudo está girando mudando lentamente em meu ser; que não tem mais três pernas; que não se sente mais seguro apoiado fixo como um tripé na tampa de concreto... Agora tenho apenas duas pernas, por isso, às vezes ainda me desequilibro, mas agora posso correr como uma galinha cega pela linha do horizonte e tentar voar, e se não conseguir ainda assim me sentirei feliz se for soprado pelo vento, como um papel de bala; é difícil obrar; e disso não sinto orgulho. Difícil é orar, quando a Igreja está deserta, com as portas trancadas, e Deus é um alemão que está lá dentro e minha ascese um déjà-vu, preso em meu coração que vibra reverbera High Vibrations! Eu estou aqui escrevendo psicologia, vivendo num Planeta dos Macacos em 1968, o filme baseado no livro de Pierre Boulle, de 1963 – estou correndo como um pato atrás de duas galinhas, que, rapidamente, graciosamente, bem à minha frente, se transformam em garças, e voam bem alto entre as nuvens, enquanto eu permaneço aqui, correndo, seguindo suas sombras, deslizando pelo asfalto, cruzando colinas e lagos e mares, sem nome. Sem me banhar em seu olhar, eu não consigo mais obrar.
Preciso agora parar de escrever e retornar rapidamente a kit e me esconder dentro do armário úmido embaixo da pia, até que a primeira barata me encontre até que a primeira estrela apareça; até que a Lua surja e me sorria, até que a brisa carregada de prana e gás, agitando as cortinas, atravesse a janela e me traga notícias suas, penetrando em minhas narinas. Que pena que eu ainda te ame, se já não consigo mais me enganar, apenas obrar e chorar...
Livre!
Livre-se de tudo!
Livre-se de você!
"Quem dirá se a vida não é morte
e a morte, vida?"
"Quem dirá se a vida não é morte
e a morte, vida?"